Castigos: Rigor ou Afecto?


Castigar ou não Castigar?
Um dos aspectos que, a nível pedagógico, maior angústia causa a pais e educadores, são as dúvidas levantadas pelo acto de castigar. Castigar ou não? Qual o castigo mais apropriado? Esta ferramenta educativa, tão universal e utilizada ao longo da história nas mais diversas sociedades, continua a gerar diferentes opiniões, e a ser alvo de amplos debates.

"Asneiras de crescimento"
As crianças não nascem com a noção de certo e errado, e não sabem, à partida, qual o comportamento adequado para cada momento. Ao seu ritmo, estas vão procurar descobrir o meio à sua volta, explorar as suas capacidades à medida que as vão adquirindo, bem como testar as reacções dos outros para conhecer e desenvolver-se socialmente. As crianças "pedem" aos adultos que lhes forneçam as ferramentas para uma socialização bem sucedida, num equilíbrio nem sempre facilmente atingível entre a liberdade dada às nossas crianças, e os limites que se pretende que interiorizem.


A importância dos limites
A tema castigos é indissociável do de limites pois, à partida, os primeiros são utilizados como ferramenta para que a criança interiorize os segundos. E, actualmente, ser pai remete para um conflito cada vez mais frequente: não passar tempo suficiente com os filhos.
Após um dia de trabalho, longe dos filhos, é natural que os pais sintam não acompanhar o seu crescimento do modo desejado. Este sentimento, aliado ao cansaço e à necessidade de realizar múltiplas tarefas domésticas leva, por vezes, à adopção duma estratégia de compensação da sua ausência, através duma maior permissividade ou, por outro lado, a uma intolerância excessiva face aos comportamentos da criança.


No entanto, tal pode conduzir à educação de crianças com dificuldades em reconhecer limites, que não sabem lidar com a frustração, e torna difícil a compreensão e interiorização das noções de certo e errado. Os filhos precisam de limites para se sentirem seguros, para se socializarem, aprenderem a lidar com a agressividade, para crescer de forma saudável. E é, especialmente quando os pais têm menos tempo disponível, que as crianças mais os requerem, pois necessitam de receber essa segurança. Quanto menos a tiverem, mais veemente a vão reclamar, colocando os pais à prova, num processo de desgaste que pode ter consequências irreversíveis na relação parental.

Os limites
A imposição de limites ocorre sensivelmente no momento em que a criança adquire a capacidade motora para explorar o meio à sua volta. Por volta dos 8/9 meses, ela começará a gatinhar, e a adoptar o comportamento saudável de experimentar e conhecer os espaços em que se encontra. E é a partir deste preciso momento que os pais se confrontam com a necessidade de julgar o que é permitido a criança fazer, e o que não é. Este facto é ilustrado pelo exemplo clássico da criança que procura descobrir o que são as tomadas eléctricas, especialmente devido ao facto de comummente se situarem à altura do seu campo de visão.


Com o desenvolvimento da criança, entre os 18 meses e os 3, 3 ½ anos, no qual se verifica um aumento da linguagem e da destreza física, a necessidade de colocar limites firmes e inteligíveis para as crianças, passa a ser uma das imposições que se colocam a pais e educadores. Esta é uma fase em que a criança procura organizar-se e explorar com grande avidez o que a circunda, e "reclama" dos adultos significativos a orientação e a organização que lhe permitam aprender o que pode ou não realizar.

À medida que a criança cresce, mantém-se sempre a necessidade desta suscitar a orientação organizativa por parte dos pais, o que se vai alterando é a possibilidade crescente dos pais explicarem as regras impostas, devido à progressiva capacidade de entendimento dos filhos. Se, nos primeiros tempos de vida os limites podem ser colocados através de estratégias mais simples, como a distracção, o agarrar, a cara de mau, entre outras, com o desenvolvimento da criança, essa tarefa torna-se mais exigente e elaborada.

Os castigos ajudam?
Antes de abordar a questão dos castigos, torna-se fundamental salientar que, embora estes sejam importantes auxiliares no processo de interiorização de limites por parte das crianças, essa aprendizagem não pode passar apenas pela sua aplicação. Pelo contrário, o poder dos castigos deverá ser sempre reduzido, quando comparado com o do afecto, do exemplo e do diálogo, que deverão ser as principais ferramentas de socialização e educação.

Habitualmente, no processo educativo, as crianças procuram ser como os seus modelos de referência, cabendo-lhes a estes serem os melhores exemplos / modelos possíveis. A interiorização e a aprendizagem de regras e limites faz-se, fundamentalmente, pela imitação e procura de identificação com os modelos de referência que as crianças possuem, da qual os pais, seguidos dos elementos de família mais próximos, educadores, professores, entre outros, assumem amplo destaque.

Surge então a pergunta- os castigos ajudam ou não? E essa é uma das questões que maior angústia causa a pais e educadores, bem como qual o castigo mais apropriado para a criança.
Os castigos ajudam, e podem ser uma importante ferramenta de educação e socialização. Mas, para tal, terão de ser aplicados com moderação, de forma correcta e coerente. Existem modos de potenciar esta ferramenta, o que será tratado de seguida.

O propósito do castigo não é castigar
É difícil dizer qual o castigo certo, para dada situação. Além de pouco sensato, um "manual de instruções" apenas serviria para produzir mais incerteza e instabilidade na hora em que se pede aos pais segurança e firmeza.
Antes de mais, para que uma criança interiorize os limites, é necessário que se sinta afectivamente ligada à pessoa que a castiga. O castigo deve ser sempre dado com carinho, com amor, e transmitir a noção de que "eu estou a fazer isto por que gosto de ti, e preocupo-me contigo".

Importa ter em conta que, na hora de castigar, por mais aborrecido que se possa estar com a criança, o objectivo não pode ser o de "castigar", de lhe causar mal estar em retorno, mas sim ter o propósito de ajudar a criança a perceber que a sua acção foi incorrecta, e que compreenda o que é esperado dela.

Quebrar o ciclo
O objectivo imediato passa inequivocamente pelo término do comportamento incorrecto que a criança está a realizar. Tal poderá ser realizado de inúmeras formas, mas o olhar, a expressão facial (cara de mau), a imposição física (ex.: agarrar), o tom de voz, firme e seguro, sem gritar, poderão ser os melhores aliados. Nos primeiros anos, um castigo que resulta com sucesso é o isolamento, ou o acto de se sentar sem actividade na "cadeira do castigo" sem actividade. Esse castigo permite à criança acalmar, para de seguida ser possível conversar sobre o assunto.


Aspectos significativos dos castigos:
Existem pormenores relativos aos castigos que devem ser levados em consideração:
É essencial que o seu propósito seja o de sinalizar o comportamento incorrecto, pelo que convém não existir uma grande distância temporal do comportamento alvo, senão incorre-se no perigo da criança abstrair-se e esquecer-se do motivo do mesmo;

De seguida e sempre tendo em conta a idade da criança, torna-se fundamental que lhe seja explicado o que realizou de incorrecto e, explicitar de forma compreensiva, clara e curta, o que pretendemos dela. Se necessário e possível, exemplificando-o.

Deverá ser num sítio que os pais possam controlar, pois além das questões de segurança, é importante que se certifiquem que a criança, durante o tempo de castigo, não tem brinquedos à disposição ou outros factores de distracção, como por exemplo a televisão; do mesmo modo, o "mandar para o quarto" ou para outro espaço semelhante é um castigo que menores probabilidades terá de ser bem sucedido, pois o mais certo será a criança encontrar tantos factores de distracção nesses espaços que provavelmente rapidamente se esquecerá do comportamento que a levou ao castigo;

Qualquer castigo aplicado deve ter em conta a idade e o desenvolvimento da criança. Sempre que possível, o castigo deve contribuir para a reparação do comportamento alvo (ex.: se sujou algo, limpar). Também é importante não intimidar a criança com um castigo que se sabe que não será possível por em prática;

À medida que a criança se desenvolve a nível verbal, pode ter um papel activo na forma de reparar o seu comportamento incorrecto. Convém permitir-lhe que ela participe e opine sobre os castigos ou modos de reparar o comportamento incorrecto;

Procurar explorar com a criança o que a levou a realizar o acto. Esta compreensão, além de demonstrar disponibilidade afectiva por parte dos pais, pode contribuir para que a criança se sinta aceite e amada, mesmo quando realiza algo menos correcto;

No fim, e de extrema importância, é importante que a criança, após ter realizado o acordado no momento, possa ter a possibilidade de ser desculpada, o que lhe faculta o entendimento de que a reparação do mal efectuado é possível;

Na maioria das vezes, as suas "pequenas asneiras" funcionam apenas como forma dela chamar a atenção dos adultos. Sempre que possível, o melhor será ignorar esses pequenos comportamentos e, ao invés, quando a criança estiver a comportar-se do modo pretendido, dar-lhe a atenção que procura, reforçando e elogiando o bom comportamento. O que é notado e reforçado tende a repetir-se com maior frequência e, mais vale salientar e reforçar aspectos positivos da criança, do que negativos.

Atenção ao que se diz, e ao modo como se diz
As palavras contam, e muito. Daí que, no processo educativo, importa realizar um constante processo de auto-avaliação, no sentido de se procurar melhorar a função educativa. Nesse sentido, há que dar uma grande importância ao que se diz, ao que se transmite, e ao que se deseja que a criança interprete.

As palavras são importantes não só na hora de se castigar. Antes pelo contrário, são fundamentais no modo como a criança interioriza o que os adultos esperam nela. As expectativas da criança sobre as suas possibilidades de sucesso são fundamentais para o seu comportamento e, ela só se acreditará capaz de ser bem sucedida, se os pais lhe transmitirem. A capacidade das crianças realizarem uma correcta avaliação de si e dos seus comportamentos é reduzida, e necessitam dos pais, como espelhos. É importante que esses espelhos lhes transmitam a possibilidade de sucesso, de serem bem sucedidos. Veja-se:

Uma criança que, depois do jantar e antes de deitar, costuma brincar com os bonecos - Os pais, ao prepararem a criança para comer, poderão dizer duas frases, por exemplo: A primeira- "Quando acabares de comer toda a sopa, vais poder brincar com os bonecos". Esta verbalização transmite o acreditar, por parte do adulto significativo, das possibilidades de sucesso da criança na tarefa, e nos bons resultados consequentes. Segunda- "Se não comeres a sopa, não brincas com os bonecos". Esta verbalização, além de funcionar como uma ameaça, transmite a possibilidade e o acreditar de que a criança não será bem sucedida na tarefa (comer), mostrando a possibilidade de insucesso como a mais previsível. É uma pequena diferença de palavras, mas é uma grande diferença pedagógica.

A hora de repreender
Quando se repreende uma criança e ela é castigada, geralmente é por ela ter realizado uma acção contrária ao que se considera correcto (por exemplo uma criança que bateu no irmão mais novo). Nesse sentido, mais do que castigar, o que se deseja é mudar esse comportamento, e utiliza-se o castigo como um auxílio para esse objectivo.
No entanto, o castigo só por si não contribui para que esse comportamento desapareça. Aí entra o poder das palavras. A partir do momento em que a criança adquire o desenvolvimento suficiente para se expressar e compreender verbalmente, as palavras utilizadas pelos pais poderão funcionar como aliados excepcionais a nível educativo ou, se mal utilizadas, contribuir para aumentar a confusão e a insegurança da criança.

Voltando ao exemplo da criança que bateu no irmão mais novo, naturalmente, os pais mostrar-se-ão desapontados com o seu comportamento, e terão o desejo de o modificar. É necessário que, ao falar com a criança, as verbalizações incidam directamente sobre o acto incorrecto. Misturar assuntos e/ou alargar muito as explicações apenas serve para desviar dos propósitos. O comportamento incorrecto deverá ser bem sinalizado, de modo a que a criança tenha a perfeita consciência do comportamento indesejável. E, por mais fácil que esta tarefa possa parecer, existem algumas "ratoeiras" em por vezes se tropeça...
Convém evitar utilizar expressões como: "és sempre assim"; "tu nunca fazes nada bem"; "és feio, mau, mal comportado"; "não gosto mais de ti"; entre outras. O que se pretende é a mudança, substituir o comportamento incorrecto pelo correcto pelo que, expressões como as referidas, não transmitem essa possibilidade de mudança. Antes o inverso, transmitem às crianças o sentimento que os pais a vêem como aquela que actua incorrectamente, sem a possibilidade de mudar, prejudicando a auto-imagem da criança. Assim, no exemplo referido, evitar expressões como: "estás sempre a bater ao teu irmão", utilizando outras que sinalizem directamente o comportamento incorrecto "os pais estão zangados porque bateste no teu irmão" e, muito importante, explicar alternativas de como os pais esperam que a criança resolva o assunto no futuro: "da próxima vez, quando estiveres chateado com o teu irmão, podes vir dizer aos pais".

Castigos corporais
Outro tema directamente ligado aos castigos são os castigos corporais, geradores de imensa discussão, bem como de imensas opiniões. Quando o propósito passa por ajudar a criança a interiorizar regras, o castigo corporal revela-se pouco eficaz. Isto porque, quando ela realmente muda de comportamento, fá-lo por medo da figura de autoridade. E tal leva-a a aprender que, perante determinada figura de autoridade, não pode ter dado comportamento. O que até a pode levar a não o realizar nesse contexto específico, mas dificilmente o evitará noutros.

A criança aprende o que pode e não pode junto dos pais e, quando estes utilizam esta norma, elas aprendem que quando lhe batem é porque fez algo incorrecto. Quando muda de contexto (por exemplo, jardim de infância e escola), ela terá maiores dificuldades em respeitar adultos que não utilizam os mesmos padrões de disciplina.

E até que idade bater? Pode-se bater a uma criança mas, quando ela cresce, já não se pode? Ou continua-se a bater? Se o bater numa criança prejudica a sua auto-estima, podemos imaginar o quanto afecta a dum adolescente.
Anteriormente neste artigo foi referido que, mais do que os castigos, a criança aprende pelo exemplo. No exemplo referido (o filho que bate no irmão mais novo), os pais procurarão ensinar à criança que o acto é errado, e que ela não deveria bater no irmão. Para uma criança (e, porque não para um adulto), poderá ser difícil compreender que não pode bater nos outros, quando os próprios pais lhe batem.
Mais factores poderiam ser englobados nesta discussão mas, acima de tudo, o principal é que se pretende que as crianças nos respeitem, e não que temam os adultos.

Conclusões
Resumindo, o acto de castigar pode ser dividido em quatro momentos / objectivos:

Interromper o comportamento incorrecto, quando possível, e sinalizar de modo a que a criança compreenda sem dúvidas o que originou a reacção do adulto. Para que a criança consiga realizar uma correcta associação entre o comportamento incorrecto e a correspondente consequência, é necessária uma rápida reacção dos pais. Acções como "no fim do dia falamos" ou "quando o pai chegar ele fala contigo" são menos eficazes;
Após adquirir consciência do comportamento reprovado pelos pais, a criança deverá conseguir compreender qual o comportamento desejado. É importante que os pais, ao explicarem o procedimento, transmitam à criança que sentem que ela será bem sucedida no futuro. Se a criança não acreditar em si, e na possibilidade de ser bem sucedida no futuro, provavelmente voltará fracassar;
Desculpar. Nenhuma criança faz alguma acção que não possa ser perdoada. A criança necessita compreender que, apesar dos erros, também os poderá resolver e ultrapassar, e voltar a obter a confiança dos pais. Só assim poderá voltar a tentar ser bem sucedida em novos desafios. Aqui os pais poderão também dar o exemplo, assumindo que também já fizeram "asneiras", tal como as crianças, e que conseguiram aprender com elas e melhorar, tal como os filhos conseguirão;
Importantíssimo, reforçar quando a criança tem o comportamento adequado! Um sorriso, um elogio no momento certo, são as melhores armas que se podem utilizar.
Apesar da importância dos castigos, importa realçar novamente que a nossa principal ferramenta educativa é a relação de amor estabelecida com a criança, esse é o principal argumento que possuímos. O principal modo duma criança aprender e respeitar limites é crescer num ambiente em que se sinta amada, e em que aprenda a amar em retribuição. A criança deseja, e quer crescer, para ser "grande" como os seus modelos de referência (geralmente os pais), e será através do seu exemplo que melhor poderão moldar o seu comportamento, e influenciar positivamente a sua socialização.
Ressalva-se que todos os pais sentem dificuldades na educação dos seus filhos. É natural cometer erros, e aprender com eles, tal faz parte da tarefa educativa. Tal como os pais mudam, as crianças também, conseguindo alterar os comportamentos. Não só a nível da disciplina, mas como em vários outros aspectos educativos, a aprendizagem dos limites é uma tarefa a longo prazo, que exige determinação, coerência, firmeza e, fundamentalmente, muita paciência e amor.

Falemos de coisas sérias: O brinquedo

A sua importância no desenvolvimento da criança


Brincar

Ao longo do desenvolvimento da criança, o brincar funciona como uma "ferramenta" que lhe permite explorar, conhecer e agir sobre a realidade que a rodeia. Ao brincar, a criança experimenta e desenvolve capacidades motoras, artísticas, criativas, cognitivas, sociais, entre outras. Este brincar, tão comummente desvalorizado, permite-lhe controlar a realidade em que se insere, possibilitando desse modo a sua integração, compreensão e experiência de diferentes mecanismos de interacção com o meio.


Quando falamos do brincar da criança, referimo-nos a algo realmente sério, pois tal acção permite-lhe desenvolver um rol de competências que, de outro modo seria, se não impossível, muito menos eficaz.

Entre outras competências, o "brincar" permite à criança desenvolver: capacidades motoras; a linguagem; ser criativa e explorar o seu sentido artístico; comparar, realizar associações, aprender conceitos de tamanho, realizar cálculos; desenvolver competências sociais - a brincar, ela aprende a socializar com os pares, a criar amigos, a resolver conflitos, a gerir sentimentos como a agressividade e a frustração, a interiorizar limites (quer sejam próprios, como impostos).



Brinquedo


Ao termos consciência do quão fundamental é o brincar no desenvolvimento infantil, importa falar sobre o brinquedo e a sua importância. Cabe a este, antes de mais, ser divertido e cativar a criança para que assim possa contribuir, de forma lúdica, para o seu desenvolvimento e aprendizagem.


O brinquedo pode ser definido como um "tradutor" do real para a "realidade da criança", que permite suavizar o impacto percepcionado do tamanho e força do mundo dos adultos, possibilitando-lhe assim manipular e evitar o sentimento de impotência. Isto é, por exemplo: uma criança, ao ver o pai a conduzir o carro, desejará ser um dia grande e conduzir, tal como ele. Mas, face à impossibilidade de conduzir o carro do pai, o poder manipular um de brincar fá-lo experimentar e vivenciar a sensação de poder que o progenitor sente.


Desenvolvimento da criança


O brincar não é sempre igual. A criança brinca e interage com o que a rodeia de modo específico, tendo em conta o estágio de desenvolvimento em que se insere, o que influencia os seus interesses e motivações naturais. E, tal como o brincar vai mudando, também as necessidades e os gostos em relação aos brinquedos alteram.


Nesse sentido, o estádio de desenvolvimento em que a criança se encontra, a sua maturidade, o seu desenvolvimento psicomotor, os interesses e motivações naturais são factores a ter em conta ao escolher um brinquedo. Até porque, a adequação do brinquedo à criança, influencia significativamente o grau de interesse que ela irá sentir, bem como o quanto esse brinquedo a estimulará.


De seguida, são abordados diferentes períodos de desenvolvimento e referidas algumas ideias sobre brinquedos que, nessas faixas etárias, poderão funcionar como aliados potenciadores de desenvolvimento:

Do nascimento ao primeiro aniversário

Nesta fase de desenvolvimento, o ideal são os brinquedos que conseguem prender a atenção das crianças sem, no entanto, as "agredir". Aqui, o brincar acenta numa relação muito pessoal entre ela e o brinquedo. É conveniente proporcionar uma estimulação multi-sensorial à criança, daí que seja adequado escolher brinquedos que estimulem diferentes sentidos, como o tacto, a audição e a visão. Para a criança, importa a variedade de cores, a textura e o movimento.


Aconselha-se: Bonecos de pelúcia agradáveis ao toque, com diferentes texturas e tamanhos (sem botões ou outros materiais passíveis de serem retirados e inseridos na boca); os móbiles que se colocam em cima da cama; os tapetes de actividades; os brinquedos para o banho; livros apropriados para bebé, quer sejam de pano, de plástico (grandes) ou para o banho; chocalhos com sons suaves e diferentes; blocos de plástico; objectos próprios que possam ser mordidos.



1 aos 2/3 anos de vida


Esta fase é caracterizada por um período de grande desenvolvimento motor e da linguagem na criança. Ela torna-se progressivamente mais activa e procura explorar cada vez mais o meio à sua volta, revelando uma enorme curiosidade e desejo de descobrir e explorar o mundo à sua volta. Durante este período, verifica-se um crescendo no interesse pela interacção com "o outro".



Todo este processo de exploração, a criança realiza-o através da utilização dos seus sentidos sem, no entanto, possuir uma grande noção de perigo, o que tão frequentemente causa sobressaltos aos adultos.


Por esta altura, verifica-se a predominância dos jogos de exercício e de manipulação, com uma maior destreza motora e um natural e progressivo incremento da sua autonomia. Este brincar favorece o sentimento de poder e eficácia por parte da criança.


Aconselha-se: bolas de futebol; jogos de encaixar e empilhar; blocos; livros, dando enfoque aos que possuem desenhos coloridos e cativantes; jogos e brinquedos que permitam empurrar e puxar; brinquedos que estimulem a linguagem como imitações de telefones e microfones; bonecos maiores; quebra-cabeças simples e adequados à idade; carrinhos, comboios, barcos e aviões de imitação.


Do terceiro ano de vida até aos 5/6 anos


Nesta fase de desenvolvimento, a criança procura cada vez mais explorar o meio à sua volta, testando a sua força física, e imitando os que a rodeiam, especialmente os pais e irmãos mais velhos. A possibilidade do jogo simbólico, recentemente adquirida, permite à criança a compreensão e a aprendizagem de papéis sociais que fazem parte da sua cultura, daí a imitação dos que a rodeiam (os conhecidos jogos dos "pais e mães", aos médicos são um exemplo de tal).


As suas brincadeiras são caracterizadas pelo desenvolvimento da fantasia, aliado ao aumento da linguagem (a criança adquire a capacidade de representar objectos, mesmo quando não presentes), o que assume um papel fundamental nas suas brincadeiras, nomeadamente através do faz-de-conta. Aqui, as histórias, os fantoches, os desenhos e o brincar com objectos atribuindo-lhes outros significados fazem parte do dia-a-dia da criança. A criança necessita de jogos que estimulem e potenciem a sua criatividade, bem como a sua actividade motora coordenada.


Aconselha-se:
Livros; diferentes materiais de pintura e desenho; quadro e giz; plasticina e massas de modelar; fantoches; máscaras e fantasias; casinhas e brinquedos de imitação do "mundo dos adultos", como são exemplo, as ferramentas, os utensílios de cozinha, entre outros; bonecos; bolas e diferentes utensílios para práticas desportivas (sempre apropriados à idade e desenvolvimento da criança), lagos, puzzles simples.




6/7 anos aos 10 anos


Por esta altura, os jogos e brincadeiras com regras assumem uma maior importância no quotidiano da criança. As brincadeiras centram-se por vezes mais nas regras das mesmas do que na actividade em si. Deste modo, o brincar e o jogo de regras possui um papel fundamental no modo como a criança aprende a seguir regras e desenvolve estratégias de tomada de decisão.

O jogo permite à criança socializar com o outro de forma mais organizada, desenvolvendo a socialização assente em conjuntos de regras, no seu respeito e na sua negociação. Tal permite socializar de forma mais organizada, descobrindo deste modo que não são os únicos sujeitos da acção e que, para atingirem os seus objectivos, devem considerar também o facto de que os outros também possuem objectivos próprios que querem satisfazer.


Neste sentido, é exigido à criança um controlo do comportamento impulsivo diferente do verificado em períodos anteriores de desenvolvimento. Estas características das brincadeiras e dos jogos levam ao desenvolvimento dum comportamento caracterizado pelo incremento do controle sobre a impulsividade, a uma maior capacidade de pensar e reflectir sobre as suas acções e a um aumento dos interesses intelectuais, o que encaixa propositadamente com a entrada para o Primeiro Ciclo de Escolaridade.


Aconselha-se:
Livros adequados à idade; diversos materiais de escrita e pintura; blocos com números e letras; jogos de tabuleiro, de agilidade mental, de atenção e memória, de habilidade motora; brinquedos de construção e montar (como por exemplo, os tradicionais legos); jogos de experiências científicas, como microscópios, lentes de aumento e outros instrumentos que estimulem uma iniciação científica; desporto e actividades ao ar livre; bicicleta.



Notas Finais


Importa realçar que as idades apresentadas são meros indicadores de desenvolvimento, de modo a organizar a informação. No entanto, estas idades não poderão deixar de ser consideradas meramente enquanto auxiliadoras. Nenhuma criança possui um desenvolvimento homogéneo. De modo natural, desenvolvem mais rapidamente umas competências do que outras. O mesmo se passa quando comparamos diferentes crianças, que obviamente possuem um desenvolvimento distinto umas das outras.


Cada criança tem o seu padrão de maturação e exige, antes de mais, que se esteja atento, respeite e acompanhe o seu desenvolvimento. Esta é uma verdade para o brincar, para os brinquedos escolhidos, e para tudo o que se relacione com o desenvolvimento infantil.
Antes de mais, ao escolher um brinquedo e/ou brincadeira, importa seguir os desejos e vontades da criança, pois é desse modo, lúdico e divertido, que poderão contribuir para o desenvolvimento das mais diversas competências da criança.

MAIS SORRISOS, MENOS BIRRAS:

Uma abordagem optimista no desenvolvimento da criança

Ainda recente no campo da Psicologia, a Psicologia Positiva caracteriza-se pelo enfoque nas qualidades do ser humano, bem como no que faz a vida merecer ser vivida e o que podemos melhorar. Deste modo, esta corrente procura quebrar a tonalidade negativa atribuída pela Psicologia, muito centrada na patologia e nos problemas, e focar-se, de forma teórica e empírica, na construção de condições que conduzam a uma melhor qualidade de vida, à procura da felicidade por parte do sujeito.

A Psicologia Positiva não possui o intuito de desvalorizar ou descredibilizar o anteriormente realizado a nível da Psicologia, nem a importância do atingido, que deve ser sempre preservado e valorizado. Pretende sim, de certo modo, salientar que, durante o desenvolvimento da Psicologia enquanto ciência, não foi priorizado o estudo da felicidade do ser humano. O que é que nos faz ser mais felizes? Como podemos incrementar os nossos níveis de felicidade? Visto estar provado que a ausência de doença, só por si, não resulta automaticamente em felicidade ou bem-estar (Marujo, H., Neto, L., Caetano, A., & Rivero, C., 2007), a questão da felicidade e do bem-estar humano têm de ser obrigatoriamente aspectos alvo de estudo da Psicologia.

Ao efectuar uma reflexão sobre a importância duma abordagem optimista no desenvolvimento da criança, importa pensar sobre o que é o optimismo. Segundo os autores anteriormente referidos, o "optimismo é uma característica individual que, embora possa ter algumas influências genéticas, pode ser aprendida e implica sempre a capacidade de ter expectativas positivas acerca do futuro e acreditar que o que está para vir é bom. Isto para além da capacidade de ver o melhor da vida. Mesmo nas situações mais problemáticas, desafiadoras e, até, dramáticas, o optimismo traduz-se na capacidade de retirar alguma aprendizagem e algum ponto positivo". Das vivências diárias e daquelas mais significativas ou marcantes, concluí-se que o que diferencia os optimistas dos pessimistas não passa pelo número de boas ou más experiências ao longo da vida, mas sim pelo modo como as percepcionam e interpretam.
Esta nova forma de interpretar a realidade (optimista) faz ainda mais sentido em contexto educativo, quer seja em casa, numa escola, num Jardim de Infância, ou outros locais em que se privilegie o papel de educador, tanto mais que se comprova que o optimismo tem repercussões directas nos níveis de felicidade, da saúde física e mental ao longo da vida, e até mesmo nos níveis de produtividade.

Atendendo ao anteriormente referido pede-se, em primeiro lugar, que quem se relaciona directamente com crianças compreenda e assuma a importância que terá no seu futuro, pois são os modelos de referência, a quem as crianças recorrerão na procura de modos de compreender e agir sobre a realidade em que se inserem. Temos de nos consciencializar que somos os principais agentes de socialização das crianças e que, consequentemente, as nossas atitudes para com elas são determinantes para o seu desenvolvimento harmonioso. É nos pequenos momentos, nos pormenores, que a criança assimila os nossos exemplos, os nossos ensinamentos. A expressão: "Faz o que digo, não faças o que faço", não tem valor num contexto educativo, pois será pelas nossas acções que a criança se guiará.

A importância dos modelos de referência "caseiros" é demonstrada através de estudos (Marujo, H.; Neto, L. & Perloiro, M., 2000) que comprovam que os diferentes membros de uma família tendem a ter níveis semelhantes de pessimismo ou de optimismo. Tal revela-nos que aprendemos a ser optimistas com aqueles que nos são próximos, e coloca às famílias o desafio (e responsabilidade) no sentido de procurarem fomentar o desenvolvimento de crianças positivas.

A consciência do peso das nossas acções no desenvolvimento das nossas crianças, exige uma reflexão sobre a forma como vivemos a nossa felicidade, como encaramos as adversidades e as transmitimos aos nossos filhos. Esta introspecção pode, e deve, ser realizada não apenas desde o nascimento da criança, mas sim desde o momento da gestação.

É verdade que ninguém vem ao mundo optimista ou pessimista, no entanto, é também aceite que o estado de espírito de uma mãe durante a gravidez tem repercursões no desenvolvimento da criança. Durante a gestação, as crianças apreendem as sensações através da sua mãe, tanto as positivas, como as negativas. É importante que as mães encarem este período de uma forma feliz e optimista, de forma a oferecerem o máximo de experiências positivas ao filho.

É sempre benéfico que, durante o período de gestação, a mãe converse frequentemente com o seu filho, oiça música que a faça descontrair, sinta o seu bebé, procure ter o máximo de experiências felizes e relaxantes, pratique exercícios de relaxamento e de visualização (imagine cenários e situações agradáveis, pratique Yoga, entre outros).


Como educar para o optimismo?

Não existe uma fórmula que nos transforme em optimistas. Todos os momentos da nossa vida podem ser encarados e avaliados de diferentes perspectivas, que podem ser mais ou menos optimistas. O povo português é caracterizado pela ideia da desgraça, do futuro sombrio, em que só nesse estado encontramos conforto (sentimento de excelência do Fado). Não querendo incorrer no erro de catalogar o povo português, não se torna difícil encontrar provas do negativismo endémico à nossa sociedade, bastando para tal ver o telejornal, e realizar uma comparação entre o número de boas e as más notícias. De certo modo, por vezes, surge o sentimento que a tragédia une as pessoas, e que é errado ser feliz e demonstrar esse estado de espírito. E essa é uma mensagem que frequentemente é transmitida às nossas crianças, a de que em criança é natural ser feliz, rir, mas que ao crescer, tudo muda. E é precisamente por aí que podemos iniciar uma mudança, começando por cada um de nós, agentes educativos.

Esta "revolução" tem de ocorrer, e é em casa e nos estabelecimentos educativos que ela deve começar. É reconhecido que ao salientarmos um traço, existe uma maior probabilidade de o repetir. Ao observarmos adultos em interacção com crianças, verifica-se a frequência com que são destacados aspectos negativos, repreensões, em comparação com os elogios aos bons comportamentos. Nós, adultos, não o realizamos por malícia, ou por desejar o mal para os nossos filhos. O que se verifica com frequência é que repetimos nas nossas crianças os modelos educativos que nos foram transmitidos, que vastas vezes não primavam pelo uso do elogio. No entanto, esses padrões educativos podem ser alterados, especialmente ao termos consciência das nossas acções e do impacto que possuem no desenvolvimento da criança. Cabe-nos a nós, adultos, realizarmos uma auto-reflexão das nossas interacções com as crianças, e analisar o feed-back que lhes transmitimos.

Ao termos o objectivo de aumentar o número de comportamentos positivos por parte duma criança, será através do elogio, do carinho no momento certo, que o atingimos. Nestas situações verifica-se a regra do que é salientado tende a repetir-se. Uma criança, ao efectuar um comportamento desejável, se obtiver a atenção positiva, uma recompensa (elogio, miminho, incentivo, não se trata de recompensa material), terá maior tendência a repetir esse comportamento no futuro. Se, no sentido inverso, atribuirmos atenção (mesmo que negativa) à criança quando tem comportamentos incorrectos, repreendendo-a, enquanto que não a estimulamos ao realizar uma atitude correcta, pois partimos do princípio que faz apenas o que é seu dever, estamos a estimular o comportamento indesejável. As crianças querem/necessitam de atenção e, se não a obtiverem através de comportamentos positivos, vão requere-la com comportamentos indesejáveis.

É claro que não se pede que se deixe de repreender as crianças quando existe essa necessidade, não é esse o propósito. Ao longo do seu desenvolvimento, é fundamental que a criança explore o seu mundo, e isso implica que os adultos necessitem colocar limites aos seus filhos. Essa curiosidade e interesse são saudáveis por parte das crianças, mas o papel dos pais passa por promover a sua socialização, o que leva a por limitar a sua exploração quando necessário. Um dos papéis do educador passa por transmitir e ensinar o que a criança pode ou não realizar, incutindo-lhe regras e limites essenciais para o seu desenvolvimento e segurança. O que se pretende é que, além do referido, se estimule a criança pelos bons movimentos que realiza. O elogio, o incentivo, a confiança que lhes fornecemos são ferramentas que ela interioriza, e que lhe ajudam a sentir confiança em si para explorar o mundo, e para resolver os problemas de forma autónoma, confiando em si, nos seus recursos, e nas pessoas que lhe são significativas.

Ao longo da nossa convivência com as crianças, por vezes tendemos a esquecer que são crianças, e que possuem uma capacidade de entendimento distante da dos adultos. Também assim o é no modo como lidam com os elogios como com as críticas. Ao realizarmos uma crítica a um adulto, ele poderá ter a capacidade de analisar o que lhe foi comunicado, e ajustar o seu comportamento de modo a evitar essa punição. Contudo, este processo mental poderá ser muito complexo para uma criança e, até certas idades, impossível de realizar. Ou seja, para uma criança que recebeu uma crítica, poderá ser muito difícil alterar e ajustar o seu comportamento, pois ainda não possui a maturidade cognitiva que lhe permita compreender que, para evitar receber a repreensão, tem de mudar o comportamento "X" pelo "Y". No momento de repreender, pede-se paciência aos educadores, cujo papel não poderá passar apenas pela crítica, mas igualmente pelo ensinar à criança o modo correcto de agir, mostrando sempre a esperança de que na próxima vez a criança será bem sucedida.

Esta dificuldade cognitiva em ajustar o comportamento aquando de uma crítica, não se verifica no momento em que recebe um elogio por um bom comportamento. Nesse caso, trata-se de um processo cognitivo mais elementar, em que apenas realiza uma associação directa entre o comportamento realizado e a atenção positiva recebida. Por aí passa frequentemente o sucesso na mudança de comportamento das crianças, o salientar os aspectos positivos, de forma a tornarem-se mais frequentes, e a não atribuição de atenção às pequenas atitudes negativas, procurando que ocorram com menos frequência. Quando não é possível desvalorizar, e a repreensão torna-se necessária, importa explicar à criança o que fez de forma incorrecta, instruindo-a sobre o procedimento desejado e, claro, mostrar-lhe que sabemos que ela conseguirá ser bem sucedida no futuro.

É importante focar uma pequena nota no que se refere às repreensões e aos castigos. Quando o adulto se depara com a necessidade de repreender uma criança, o seu propósito não é o vingar-se ou fazer mal à criança. O objectivo é sempre o de alterar o comportamento, que a criança tenha consciência de que o que realizou é incorrecto, e que esperamos no futuro que altere o comportamento específico que o levou à repreensão. Dessa forma, ao falarmos com a criança, devemos evitar expressões como o "És sempre assim", "Nunca fazes nada bem", entre outras. O mal de expressões como as referidas (entre outras) é que, além de não comunicarmos à criança qual o comportamento que consideramos incorrecto, não lhe transmitimos a esperança de o poder alterar, qualificamo-la de forma negativa, estamos a prejudicar a autoconfiança e a obstaculizar um sucesso futuro. Quanto ao comportamento em questão, é importante referir, de forma clara, o que desaprovamos, pois é o que queremos modificar e, de forma construtiva e optimista, comunicar-lhe o que esperamos dela, delegando-lhe a responsabilidade de confiarmos que, no futuro, conseguirá realizar o comportamento desejado. Expressões como as referidas anteriormente (sempre e nunca) funcionam mais como uma avaliação geral à criança, ao invés de focar o comportamento específico, aquele que realmente queremos alterar.

Optimismo ou fuga aos problemas?

Esta perspectiva de encarar o papel educativo e, em geral, a vida não implica a negação e a desvalorização dos problemas e dificuldades que surgem. O que incentiva e estimula é uma perspectiva construtiva, centrada na procura de soluções para os mesmos. Nesses aspectos, a dinâmica familiar possui uma importância vital no desenvolvimento da criança. É nos diversos momentos, que tão irreflectidamente desvalorizamos que podemos realizar a diferença: no caminho para casa; nas refeições; na realização de tarefas escolares, entre outras.

Nos diálogos importa valorizar as qualidades da criança (e dos adultos), apreciar os seus esforços, e transmitir a confiança de que podem/conseguem ultrapassar os problemas com que se deparam, pois têm esse potencial. Procurem adoptar na vossa família um poder democrático, em que todos possuem opiniões válidas e interessantes, e com o qual é possível estimular a troca de ideias, mesmo que opostas, promovendo a aceitação e o diálogo numa perspectiva de procura de soluções, ao invés da passividade e pessimismo.

Cabe-nos a nós questionarmo-nos sobre as coisas boas da nossa vida, e fazê-lo com as crianças.
Tão frequentemente, ao falarmos entre nós, de imediato fazemos referências ao que de mau nos ocorre, e esquecemo-nos do quão bom é viver. Todos nós passamos por acontecimentos positivos e negativos, essa é uma realidade. A grande diferença encontra-se no modo como eles são vivenciados e explicados. Ao passo que um pessimista terá uma maior tendência em acreditar o acontecimento negativo como sua culpa, e a acreditar que "será sempre assim", e que "não há nada a fazer"; o optimista tenderá a justificar esse mesmo acontecimento como algo pontual, que aconteceu naquelas circunstâncias, mas acreditando que existe a possibilidade de solucioná-lo.

Deste modo, o que se expressa às nossas crianças influencia-as muito precocemente. Por exemplo, uma criança que recebe uma nota negativa, tenderá a pensar que é "burra", que não tem capacidades para aprender, ou poderá acreditar que teve esta nota porque o teste foi difícil, e começar a planear o que terá de realizar, para que, no próximo, tenha uma boa nota. Estas "pequenas" diferenças têm implicações, quer no futuro próximo (o modo como se implica no próximo teste), quer na idade adulta. Cabe-nos a nós reflectir sobre como queremos/podemos apetrechar as nossas crianças, e que modelos queremos ser.

"A vida é como um cobertor demasiado pequeno. Puxa-se para cima e fica-se com os pés de fora, sacudimo-lo para baixo e ficamos a tremer de frio nos ombros; mas as pessoas bem dispostas conseguem encolher os ombros e passar uma noite muito confortável."
Marion Howard

Sexualidade da Criança

Ao abordar o tema da Educação Sexual, deparamo-nos com uma realidade com a qual pais e educadores sentem a responsabilidade de informar e debater questões ligadas à sexualidade, com os seus filhos. Contudo, por se tratar de uma área que pode, muitas vezes, ser interpretada de forma reducionista, com uma carga sexual-genital, os agentes educativos tendem a sentir algum embaraço e insegurança na forma de abordar o tema. Na generalidade dos casos, a inexistência de modelos na sua própria infância, torna esta tarefa parental nova e, deste modo, vêm-se como menos preparados para a realizar.

Para tal há que considerar o que é a Educação Sexual: é realizada mesmo quando julgamos que não o fazemos. Ela está ligada à vida: aos momentos que partilhamos, ao mudar as fraldas, os afectos, as carícias, comentários a um programa de televisão, o momento de dar banho, os exemplos que damos, etc.

Desta forma, é importante que tenhamos em conta que estamos a moldar as nossas crianças, bem como a transmitir-lhes valores, mesmo quando pensamos que não. Como essa educação sexual já está, mesmo que implicitamente, a ser desempenhada, é chegada a altura de assumirmos a importância da sua abordagem explícita.

Grande parte dos problemas ligados à vivência da sexualidade têm origem na falta de informação e na ansiedade daí gerada. Da mesma forma, a ignorância sobre estes assuntos poderá resultar numa baixa auto-estima, promover um desenvolvimento não harmonioso, desencadear situações de culpa ou de medo. Mesmo actualmente, numa sociedade caracterizada pela facilidade em adquirir informação, a importância da família é sempre distinta, dada a tonalidade emocional e afectiva implícita.

Daí a importância de promover uma educação sexualizada, e contribuir para a formação de crianças, jovens e futuros adultos com mais capacidade de se sentirem bem consigo próprios, de amar, de se realizarem sexualmente, de se sentirem felizes.

Nascimento da criança
A sexualidade é uma força viva do indivíduo, um meio de expressão dos afectos, uma maneira de cada um se descobrir, bem como descobrir os outros.

Desta forma, é desde o nascimento da criança que se deverá começar a pensar em Educação Sexual, algo que não pode ser considerado distinto de todo o processo educativo.

Nos primeiros meses de vida, toda a relação está ligada ao tocar, às carícias, às respostas dadas às necessidades que a criança vai manifestando, ao contacto corporal que se permite e se promove. Esta fase centra-se muito na estimulação da capacidade de comunicar, de desenvolver sentimentos associados à segurança e à confiança, que permitirão equilibrar e estruturar as reacções afectivas que se desenvolverão no percurso de vida. Desta forma, estamos a promover as bases para uma boa evolução afectiva, sexual e social.

Identidade Sexual
O processo que vai permitir à criança encontrar a sua identidade sexual, o ver-se como pertencente ao sexo que tem, inicia-se muito precocemente. Na maioria dos casos, tal começa a ser trabalhado mesmo antes do nascimento da criança (a decoração do quarto, as cores das roupas, os brinquedos escolhidos, etc.).

Este é um desafio que obriga os pais a estarem abertos e atentos à sociedade actual, de forma a não se deixarem guiar por uma educação baseada em valores e normas mais tradicionais dos papéis sociais masculinos e femininos. Um rapaz não o deixa de ser só por desejar brincar com bonecas, nem se deixa de ser uma rapariga por gostar de jogar à bola e subir a árvores, antes pela possibilidade de experimentação se consolida o género.

Cabe aos pais e aos educadores ir aprovando comportamentos facilitadores do bem-estar da criança durante o desenvolvimento do seu papel sexual, aceitando-o positivamente e facilitando assim o seu processo pessoal de construção da identidade sexual.

A idade dos "porquês"
O desenvolvimento da linguagem e a sua manipulação, vai permitir explorar o mundo à sua volta. Neste período surge, por volta dos três anos, a fase do "Porquê?". Nesta etapa de vida da criança, a temática sexual é quase obrigatória. Temas como as diferenças anatómicas, de roupa, de jogos, a sua origem (a célebre pergunta: "de onde vêm os bebés?"), são motivos que causam enorme interesse e curiosidade na criança.
Curiosidade pelo corpo
Paralelamente às dúvidas e curiosidades que coloca através da linguagem, a criança explorará o seu corpo, tentando conhecer e promover as sensações que produz. É a fase do reconhecimento do seu sexo, do toque e da observação. É frequente mostrar os seus órgãos sexuais, bem como compará-los com os das outras crianças para melhor se reconhecer nesse confronto com o outro.
Para os pais, o facto de uma criança explorar o seu corpo na procura de o conhecer e de sentir prazer, é uma actividade que frequentemente causa apreensão. Porém, estes comportamentos são naturais, fazem parte do desenvolvimento, e é com essa mesma naturalidade que deverão ser encarados. É possível orientar a criança, sem a culpabilizar pelo facto de ter essas manifestações na intimidade, dizendo frases do tipo: "Faz antes isso no teu quarto". Há que evitar atitudes repressivas, que podem ir no sentido inverso ao desejado: a promoção do bem-estar no seu corpo.
Ao nível do jogo, as crianças procuram brincadeiras que incluam o toque e a descoberta do corpo: brincar aos pais e às mães, aos médicos e aos doentes, etc. Estes jogos funcionam como uma ferramenta, que permitirá a comparação dos seus órgãos com os dos amigos e os dos adultos, bem como a descoberta de que lhes dão prazer. É nesta fase que provavelmente se inicia a associação entre sentimentos associados a uma vivência sexual e órgãos genitais.
Cabe aos adultos dar à criança a oportunidade de realizar com tranquilidade e sem fantasmas a exploração dos órgãos genitais. Desta forma, estaremos a contribuir para que a criança possua uma imagem corporal mais íntegra e satisfatória.

A relação triangular pai, mãe e criança

Nesta fase de descoberta dos órgãos sexuais e de observação das diferenças entre géneros, é natural que existam diferenças no relacionamento com os pais. Processa-se uma relação triangular com os dois pais e o(a) filho(a), que vai ser caracterizada, consoante o género da criança, pela atracção do pai ou da mãe numa rivalidade com o progenitor do mesmo sexo. É através deste "conflito" potencial, que será resolvido pela aproximação progressiva do pai em relação ao filho e da mãe em relação à filha (processo de identificação), que vai estruturar a criança em relação ao próprio sexo, de uma forma diferenciada para o rapaz e para a rapariga.


É fundamental os pais compreenderem, com ternura, esta fase de crescimento, marcando, no entanto, os limites dos sonhos e desejos dos seus filhos. Tal passa pela afirmação dos seus próprios afectos e pela ligação de amor entre o pai e a mãe. Os filhos devem aprender a respeitar a existência de intimidade entre os pais, sem que isso corresponda a um sentimento de perda de amor.

Ultrapassada esta fase (a denominada fase Edipiana), existe uma grande mudança na forma como as crianças vivenciam a sexualidade.


Os seis anos, e a entrada para a escola
Entre os seis e os sete anos de idade, verificam-se grandes alterações na vida da criança. Este período coincide com a entrada para a escola e, com ela, surgem novos companheiros, outros adultos, importantes aprendizagens e novas exigências pessoais e sociais.

Podes ser considerada como uma fase promotora do desenvolvimento intelectual. Nesta, a actuação dos pais e educadores deverá centrar-se na resposta sincera às questões colocadas e na promoção do diálogo, aproveitando para tal todas as situações, como são exemplo a leitura de livros, comentários a filmes e programas televisivos, ocorrências do quotidiano, etc.

Cabe aos adultos de referência reflectir sobre o que querem que seja assimilado pelas crianças. Analisar os nossos comportamentos, ponderando se estes transmitem o que pretendemos, os modelos dos quais as procuramos dotar, os horizontes que lhes apresentamos e ajudamos a descobrir. Enfim, a nossa filosofia, ideologia e atitudes influenciarão os comportamentos e sentimentos das crianças, imprimindo-lhes estes aspectos de diferentes modos para toda a vida.


Notas Finais
É importante os pais reviverem narrativamente e entre si a sua própria infância e adolescência: o modo como foram sentidas as questões, dúvidas associadas à sexualidade, o meio pelo qual acederam à informação e, a percepção e sentimentos agregados a estas informações recolhidas. Este diálogo do recordar, permite ensaiar e debater, de forma antecipada e estruturada, questões relativas à educação dos filhos do casal.

Durante a infância, as crianças questionam-se sobre os mais variados temas. Estas perguntas devem ser atendidas à medida que vão surgindo, permitindo a assimilação e estruturação das suas respostas, daí que devem ser adaptadas ao nível etário da criança. De igual modo, também noutras áreas, convém aproveitar as oportunidades que vão surgindo no quotidiano para debater estas questões. Importa que as crianças se sintam acompanhadas por pessoas nas quais confiem, adultos que vivem o que ensinam, e que são capazes de estabelecer laços afectivos. Salienta-se ainda que, o que é dito terá de ser repetido outras vezes, pois o seu crescimento possibilita uma compreensão diferente da mesma questão.

Na abordagem do tema da sexualidade, é conveniente associá-lo ao amor, à ternura, ao bem-estar e ao prazer, para que as crianças compreendam que, enquanto forem crianças, não poderão ter relações sexuais, pois o corpo não está suficientemente amadurecido. Como outras coisas na vida, elas acontecerão mais tarde.

A sexualidade, como componente da vida do indivíduo, deverá ser transmitida de uma forma positiva, salientando as qualidades da comunicação, da ternura, da transmissão dos afectos e do prazer.


O modo como a ternura , o amor e o carinho são expressos entre os pais, e de pais para filhos, é a forma mais autêntica e genuína de comunicação da afectividade e sexualidade. Como lidamos com o bebé e a criança, a acarinhamos, comunicamos com o seu corpo, conversamos, vai repercutir-se na qualidade das relações futuras, isto é, o futuro começa hoje.